O nosso propósito

Ao término de mais um workshop de uma das nossas acelerações que estamos fazendo com o iPlurAll, fomos todos chamados à reflexão: qual é o seu propósito? 

Confesso, que depois de 55 anos de estrada a pergunta ainda me balançou. Para ajudar na reflexão, o mentor nos fez passar por vários momentos de inspiração, usando metodologias e ferramentas como o Ikigai, com um único objetivo: desvelar aquilo que se esconde lá no fundo do nosso coração e que nos faz mover. 

Realmente não é uma pergunta fácil de ser respondida.  Senti como se estivesse de novo na pele do meu “eu adolescente”, frente ao final do ensino médio, forçado a optar por uma carreira.   

A sensação era um misto de perplexidade e raiva: será que tenho realmente esta resposta?  Será que o desejo que carrego é realmente meu?  Será que não estou contaminado das influências que somos submetidos ao longo da vida e carrego as ideias como se fossem minhas?  Até que ponto não é uma ilusão criada por mim ou uma autoafirmação ainda não completamente superada? 

Com o passar dos anos, as poeiras vão se assentando, e como camadas adormecidas vão se depositando, pouco a pouco, se incorporando, criando uma nova pele. 

Tarde da noite, resolvi passar a responsabilidade da solução deste problema para o meu travesseiro. 

Ao acordar, me veio à lembrança a imagem de Hebert Simon e a racionalidade limitada das aulas de um dos meus cursos de pós-graduação em administração: num processo de decisão não temos condições de conhecer e considerar todas as variáveis de um problema e conectá-las de forma a chegar a uma conclusão plenamente racional.  Então, o que fazemos é seguir nossa intuição. 

Peguei o meu celular, coloquei o fone e deixei fluir um som, para vir à tona alguns insights. 

Olhei para o lado e comecei a ver alguns fantasmas do passado…que estranho. Será que estou delirando? 

Apareceu Rose, uma professora que tive com 10 anos, que como todo menino desta idade, me apaixonei perdidamente.  Ela me sussurrou algo, que não entendi muito bem e depois sumiu. 

Veio então o Sr. Uzan, um professor francês que tive no ensino médio, que numa conversa franca,  quando prestes a fazer o vestibular, me sugeriu firmemente seguir uma carreira ligada à área  científica, em função do meu desempenho nas matérias lógicas. 

De repente minha mãe interrompe o meu professor e começa a trazer para o bate-papo a questão social e o seu ideal por um mundo mais justo.  Dizendo isso, ela se vira para meu pai, que toma a palavra e mostra sua própria jornada, sem muitas escolhas, mas que tomou como sua cada uma das oportunidades que surgiram, sem se indagar se cada uma delas era sua real vocação. 

Vi minha esposa, sorrindo para mim, sempre compreensiva e apaixonada, falando “siga o seu coração”.  Disse isso, se virou, e continuou brincando e gargalhando com as tiradas de seus alunos de apenas 5 anos de idade. 

Neste ciclo mágico de imagens, apareceram muitas pessoas que fizeram parte do meu caminhar até aqui, e que de certa forma, foram formando, pedaço por pedaço, o que sou hoje.  Todos surgiam e se misturam num emaranhado de fisionomias. 

Olho para o lado e lá está de novo Simon. Desta vez, calado, somente sorrindo para mim.   

Espantado, me retorno, volto o olhar para traz e uma multidão de rostos conhecidos todos olhando para mim.  E seguindo o exemplo de Simon, emitem um sorriso. Vi naqueles rostos o mesmo sorriso, que tanto me caracteriza.  Aos poucos, como num passe de mágica, os rostos vão se transformando, e ganhando a forma do meu próprio rosto.  Todos sorrindo para mim. 

Me levanto, ainda meio perdido, sem saber se estava sonhando ou acordado, e desligo o fone. 

Volto para trás e ninguém mais estava lá. 

E tomado por um momento de euforia, percebendo a minha real dimensão, pensando em cada um que estava me acompanhando pela manhã, humildemente digo:  

Encontrei não o meu, mas o NOSSO propósito!